La femme aux bas blancs, Eugène Delacroix
“(…) - Oh, suave juventude, bem mais bela que este corpo que tem o condão de a inflamar!
E, com as duas mãos, pôs-se a mexer no fecho do meu colarinho, desabotoando-o com uma incrível rapidez.
- Tira tudo, tira tudo, desembaraça-te de tudo e disso também – disse ela, voluvelmente. – Tira tudo e despe-te, para que eu te contemple, para que eu te contemple o deus! Depressa!
«Porquê, quando a hora te chama, não estás ainda pronta para a capela! Despe-te depressa que eu conto os instantes! O atavio das núpcias…» É assim que chamo os teus membros de deus, que eu tenho desejo de te contemplar, desde que te vi pela primeira vez. Ah, até que enfim! O busto sagrado, os ombros, a doçura dos braços. Desembaraça-te de tudo isso; é isso que eu chamo gentileza! Vem para mim, meu bem-amado! Vem para mim, para mim!
Nunca uma mulher usou duma linguagem mais expressiva! Era um canto que se exalava dela, nada mais. E ela continuou a exprimir-se assim dessa maneira quando eu estava a seu lado. Era do seu feitio definir tudo por palavras, mas ela tinha nos seus braços o aluno da severa Rosza. Ele encheu-a de felicidade e teve a honra de lho ouvir dizer.
- Tu, o mais doce! Tu anjo do amor e monstro da volúpia! Jovem demónio, criança tenra, como tu percebes disto! O meu marido, esse, não compreende nada do assunto, nem, fica sabendo, é capaz de nada. Tu embriagas-me e matas-me! O êxtase corta-me a respiração e parte-me o coração…O teu amor faz-me morrer! – Ela beijou-me os braços e o pescoço. – Trata-me por tu – gemeu ela, subitamente, perto do paroxismo supremo. – Trata-me por tu, rudemente para me humilhares! Adoro ser humilhada! Adoro! Oh como te adoro, pequeno escravo estúpido, que assim me envileces!
Ela caía em delíquio. Nós caíamos em delíquio. Eu tinha-lhe dado o melhor de mim mesmo. Embora ela me desse prazer, em compensação eu tinha-lhe pago com juros (…)”
As Confissões de Félix Krull – Cavalheiro de Indústria, Thomas Mann. Ed. Relógio D’Água, 2003
(Entretanto, o Chá Verde ficou muito feliz por Portugal ter, finalmente, feito isto. Bom fim-de-semana)
3 comentários:
Mann e Delacroix. Estranha mistura, mas gosto muito dos dois. :)
Vejo sempre uma «glória» nos quadros de Delacroix.
Ora bem foi essa «glória» que também identifiquei no texto de Mann!A glória da fêmea ... ;)
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