terça-feira, abril 1

CHÁ COM TORRADAS #226

Das coisas verdadeiramente importantes. No Diário Insular, de dia 30, TIBÉRIO LOPES, na primeira tese de mestrado sobre o fenómeno das associações juvenis nos Açores, conclui que as associações juvenis são passivas, essencialmente recreativas, desligadas da sociedade, sem causas e desencantadas com a política.

"Qual é o retrato das associações juvenis que sai deste trabalho de mestrado?
Nesta tese de mestrado, que apresentei na Universidade dos Açores, deparei-me com uma situação de que não estava à espera, que é o facto das associações juvenis não serem muito mobilizadoras e basicamente reproduzirem o modelo de relações sociais que os jovens têm no exterior. Os jovens entram numa associação porque estão lá o irmão, o primo, os amigos… Não pela defesa de uma causa ou de um ideal. Apercebi-me, também, o que é um dado muito importante, que a maioria das actividades é recreativa. Outro aspecto de relevar é o facto da maioria das decisões sobre o plano de actividades ser tomada pelos mais velhos, os que têm mais anos de associação. Os que lá estão há menos tempo não interferem muito nessas decisões. Isto significa que pode haver um enviesamento, do tipo: “Nós produzimos para que eles façam”. O pode levar a que não haja outro tipo de actividades...
(...)
São portanto, como dizia, associações que assentam principalmente no aspecto recreativo…
Desde 2006 que analiso os planos de actividades de todas as associações juvenis dos Açores. Não vejo nos projectos 10 por cento de criatividade e empreendorismo. Não vejo algo que seja por causas, por mudança, pelos jovens fazerem uma reflexão sobre os próprios projectos. Quando vejo um acampamento sei que isso é uma actividade, mas é preocupante se não existir mais nada que implique reflexão sobre a sociedade, sobre o mundo juvenil, sobre a própria associação… Quando não vejo nada disto, nada sobre a pobreza, ou mesmo sobre os órgãos de comunicação social e a proximidade que eles devem ter junto do ensino secundário, a conclusão é que essas causas não estão lá.
As associações juvenis são apolíticas?
São de certa forma apolíticas, visto que os seus membros não vêem a intervenção na sociedade e mesmo a própria política como solução. Os jovens manifestam vontade de participar, mas não encontramos resultados. Não encontrei dados sólidos que lhes permitam dizer que de facto se batem por causas, nomeadamente nos planos de actividades.
As associações juvenis estão muitas vezes, por outro lado, ligadas a estruturas políticas… São rampas de lançamento para futuros líderes, digamos assim…
Isso não se verifica em todos os casos, mas temos associações de juventude onde isso existe. É algo próprio da estratégia política. Há um prolongamento da possibilidade de chegar a determinados públicos através das associações. Por outro lado, para quem está lá, é uma forma de chegar ao poder político. Vamos supor que temos uma associação em Santa Bárbara. Podemos fazer parte da linha política ou não, mas estamos favorecidos no sentido de podermos desenvolver projectos na freguesia. Há poder de intervenção e visibilidade. O que vejo nas associações juvenis é que há visibilidade, mas não há impacte junto dos jovens.
Explique-me melhor essa ideia.
Não tenho dados científicos, mas vejo que não se proporciona uma mudança.
Se aquilo que os jovens nas associações fazem é convívio e lazer, centrados nos grupos a que pertencem, não pode existir essa evolução.
Que juventude surge retratada neste trabalho? É desencantada?
É uma juventude passiva dentro das associações. Mas é, ao mesmo tempo, uma juventude com um bom sistema de valores em relação à família e em relação aos amigos. Embora motivada para a participação social, esta juventude encontra no campo da sua acção o poder político como a última solução. Tem um excelente quadro de valores, mas não vê na política nenhuma vantagem para intervir na sociedade. Também podemos interpretar isso como um sinal descrença em relação aos políticos. Existe uma falha.
As associações têm duas grandes funções, a que chamamos de “interface”, ou seja, a função social e organizacional. Isto tem de funcionar. Por um lado temos os estatutos, a hierarquia e depois vem a função social, mobilizadora, cognitiva. Não se verifica mudança no seio da associação nem mecanismos para que isso aconteça na sociedade. Este “interface” deixou de funcionar. A função social está a falhar.
(...)
Que impacte se pode dizer que estas associações juvenis têm no arquipélago?
No meu trabalho concluo que as Associações Juvenis dos Açores manifestam, pela acção e presença dos jovens, uma dinâmica favorável ao desenvolvimento das relações de proximidade e às redes de sociabilidade. Há uma valorização da família e dos amigos, proporciona-se a realização das aspirações pessoais e individuais, constrói-se uma concepção de cidadania, a própria identidade e cria-se a disponibilidade para participação na sociedade no futuro, como cidadãos do espaço local e regional. Mas é preciso ver que existiam, até 31 de Dezembro de 2006, 31 associações, com mais de 10 mil pessoas envolvidas. Isto significa cerca de cinco por cento da população dos Açores. Se tivermos em conta este número, esse impacte não devia ser mais visível?"


NOTA:
E ninguém está preocupado? A 2 de Setembro do ano passado escrevi num artigo intitulado ASSOCIATIVISMOZINHOS…
"...A opção azórica tem sido pelo associativismo instantâneo, ou de não comprometimento, no espaço público. Associativismo financiável e financiado. Quem perde? Todos nós..."

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