segunda-feira, abril 23

PURO PRAZER #282


Pode parecer uma incongruência este blogue, no Dia Mundial do Livro, fazer, ali na barra lateral, a apologia de um livro infanto-juvenil, ainda por cima numa versão brasileira. Mas tudo se explica. Mercê de mudanças em casa paterna chegam-me alguns caixotes, que encerram um misto de desagrado ao pretenderem reduzir a minha infância e juventude a espaços mensuráveis e de magia pela redescoberta e da lembrança. Assim estou eu agora. Voltar a desfolhar as folhas amarelecidas d' Os Meninos da Rua Paulo (e ficar com elas soltas nas mãos), do jornalista e escritor húngaro Ferenc Molnár (1878-1952), tem uma carga emocional. Este livrinho de bolso que me foi oferecido, já nem me recordo por quem, há cerca de 25 anos atrás, é o livro que mais vezes li na minha infância. Li, reli, treli...E bem se percebe porquê. Mais do que todos da colecção dos Cinco ou dos Sete, este pequeno livro, em versão brasileira (passados tantos anos continuo a desconhecer a existência de uma versão de uma editora portuguesa), foi o que melhor me ilustrou alguns valores e ideias, que, para mim, vão mantendo actualidade. A amizade, a solidariedade, a liberdade, a causa colectiva, o mundo dividido (na altura dividido entre a Rua do Poço e a Avenida "E"), a alegria da juventude, a traição e o perdão. Publicado pela primeira vez em 1907, com o titulo original A Pál utcai fiúk, este clássico juvenil parece ter por ponto de partida, 1889, quando, nos arrabaldes de Budapeste, um grupo de jovens, a "Sociedade do Betume", alunos do mesmo colégio, costumava reunir-se, depois das aulas, num baldio (o grund), para jogar péla, organizar um clube, um exército, simular eleições, sentirem-se importantes, viver num mundo que fosse só deles. Noutro ponto da cidade, uma ilhota do Jardim Botânico, outro grupo de meninos, os "camisas-vermelhas", formava o seu império de faz-de-conta. Apenas não tinham espaço para jogar péla. Daí ocorrer-lhes a ideia de ocupar o grund da Rua Paulo, tomando-o ao primeiro grupo. Dessa "guerra", e das relações humanas que ela revela, trata o livro. Essa "guerra" é a apenas um possível retrato da infância de qualquer um de nós. Por isso, é um livro inesquecível. Por isso, torno a recomendá-lo. Boas leituras...

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